O relógio contava as horas. E eu, Bianca, contava as pessoas na rua. Engraçado, mas parecia-me de dentro daquele carro que o mundo lá fora se entupia cada vez mais de gente, e não se esgotava. Haveria tanto espaço assim? Tá, tudo bem, sei que existe a morte, mas meus olhos se enchiam de vida a cada ser que encontrava na rua. Porém, é claro que os meus olhos que se enchiam de vida eram apenas aqueles que todos conseguem ver, o estético, que tem 0,20 de artigmatismo e que se parecem com os do meu avô. Mas eu encarei alguns nos olhos e fiquei até zonza por tantas coisas expressas. E isso não me parecia vida. Estranho - pensei. Eu realmente achei à alguns segundos que o mundo estivesse se esgotando por demasiado, como pode àquilo não me mostrar vida? Se era daquilo que o mundo se enchia?
O Sinal abrira, com sua luzinha verde de sempre, indicando aos motoristas que seguissem caminho, só que continuamos inerte. O tráfico é grande e acho que está engarrafado (Não no sentido literal). Continuei olhando para janela, gosto de observar. Uma sensação ruim a que eu tenho agora, parece estragada, com cheiro de manga podre e gosto de cerveja quente, sentia como se estivesse pulado de cabeça em uma caixa de isopor cheia de gelo. Dramático né? É porque a vida lá fora parecia-me muito sem cor, sem flor sem sabor. Seria em preto e branco? Ou de uma só dor? O ar era podre, como uma maça que apodrece com o tempo, com o vento. O mundo agora, me parecia demasiadamente grande, para tantas imperceptíveis pequenas vidas. Onde estariam? Não no meu bolso, garanto. Você sabe por acaso?
Os carros da frente se moveram igual tartarugas sonolentas ao contrário dos motoristas irritados que os dirigiam. Buzinas desesperadas e inúteis soaram piores do que o zum-zum-zum que os mosquitos fazem durante a noite. Mandei um sinal com as mãos, (muito sutil por sinal) para fora da janela, um dedo do meio carregado de impaciência.Bufei.
O ar que respirávamos certamente não fazia bem à ninguém, contaminava as minhas veias nasais. Era seco e opaco. Deixava-me alterada, essa poeira toda que entrava em mim.
O mundo me parecia cada vez maior e ao mesmo tempo sem espaço.
Os olhos vistos superficialmente aparentavam ter vida, mas ao ver mais fundo não conseguia enxerga-la. E isso não é por culpa do meu artigmatismo. Será de minha impaciência? Ou de minha insensatez? Que seja. Vida ali não havia. E isso era tão nítido quanto a minha pressa.
Estamos engarrafados; literalmente. Onde a garrafa é o mundo e seu conteúdo somos nós. Mas a grande questão e contradição é que a garrafa está vazia. Então como poderíamos estar nela? Se ela é apenas vazio?
O relógio ainda conta as horas. E eu continuo contando as pessoas.
(!?)
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Júlia Rena